Tenho sempre em minha bolsa, ou pasta, um bloco onde anoto e desenho o que no momento me ocorre. Verdadeiros diários em forma de imagens, cartas visuais endereçadas a mim mesmo. Uma espécie de inventário visual, esfinges gráficas, com a função única de expressar a parte de um todo. Todo que não sei qual seja ou será.
Jamais tive a intenção de que estes desenhos estivessem inseridos em uma objetividade, coerência ou em qualquer projeto. Cada página é uma página, cada desenho é só um desenho. Só e coletivo, ao mesmo tempo.
O que sempre quis é que eles expressassem unicamente o prazer de desenhar, algo compulsivo em minha vida. Enfim, o desenho pelo desenho.
Muitos dos livros que ilustrei, o estilo que utilizei já aparecia, muitos anos antes, nestes blocos. Fiz um retrato de meu filho Diego quando menino, muitos e muitos anos antes de ele nascer… Acredito que o desenho se origina antes do desenho. Nenhum misticismo nisso. Na verdade, desenhamos a expectativa do ver, ou seja, muito antes de criar uma imagem, esta imagem já existia. Vemos aquilo que sonhamos e queremos ver, pouco importa o que estamos vendo.
Portanto, apesar de ter afirmado há pouco que estes “moleskines” não tinham nenhuma função além do prazer de desenhar, em contrapartida a isto, a realidade nos mostra uma outra face, uma outra constatação.
Acredito que para exercer com plenitude a criação de uma imagem objetiva, seja para um cartaz, para uma ilustração, ou mesmo no projeto de uma marca, acho importante que este artista esteja habituado, de forma diária, com a imagem subjetiva. A explicação se origina de sua ausência. Ou seja, os cadernos de desenho são o relicário da não explicação. A terra fértil para a objetividade. A astronomia surgiu da astrologia, a química da alquimia.
Tudo o que vou fazer em termos de imagem eu já fiz, ou estou rabiscando em meus “moleskines”.
Rui de Oliveira – agosto de 2006 – Rio de Janeiro
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